11 dezembro 2025


Carta ao Menino Jesus


Querido Menino Jesus,


                                    Hoje resolvi escrever-te, talvez para matar saudades de um tempo em que tudo parecia mais simples. Escrevo-te como quem abre uma janela para os tempos antigos, aqueles em que a infância tinha cheiro a lareira acesa, a musgo apanhado na encosta e a mãos frias de tanto o apanhar para o presépio. Ou talvez porque, no meio desta correria moderna, sinto falta do silêncio que havia nas nossas aldeias quando o Natal se aproximava. Escrevo-te porque ainda acredito em ti, Menino Jesus, e apenas em ti. Porque foste sempre o centro desta data e não o velhote gordinho de barbas e fato vermelho que o mundo inventou para te substituir. Esse pertence ao comércio. Tu pertences à Fé e à memória.

        Lembro-me, Menino Jesus, que quando éramos crianças os mais velhos eram vistos como livros vivos, como mestres da vida. Olhávamos para eles como quem olha para um farol. As suas histórias, mesmo as repetidas, tinham valor. Eram lições embrulhadas em simplicidade. Naquele banco de madeira ao pé da lareira e das panelas que aqueciam a água, estava guardada toda a sabedoria que, para nós, parecia infinita. Bastava sentarmo-nos a ouvi-los para aprendermos qualquer coisa sobre a vida, sobre a paciência, sobre a coragem. E nós, pequenos, acreditávamos. Ouvíamos. Respeitávamos. Era assim, e parecia tão natural como o frio de dezembro. Hoje, infelizmente, parece que perderam esse lugar. Vivemos num tempo em que o que conta é a novidade, não a experiência. O imediato, não a sabedoria.

        Hoje, tudo mudou. A sociedade corre! Sempre a correr, como se viver fosse cumprir metas. Os mais velhos deixaram de ser mestres para serem postos de lado, como se o mundo já não precisasse da sua memória. Mas precisa, Menino Jesus. Precisa mais do que nunca. Porque sem memória, perde-se o rumo. Perde-se o sentido. Perde-se o Natal.

        E é por isso que te escrevo, Menino Jesus. Porque sinto que precisamos de reencontrar o Natal que foi nosso. Não o Natal das prateleiras, dos anúncios, das compras sem fim. Mas o Natal que nascia numa pequena mesa, ao lado do presépio que construíamos com o musgo colhido no monte, figuras de barro coloridas, papel pardo transformado em montanhas e a velha estrela dourada que insistia em cair. Era nesse trabalho conjunto que aprendíamos o que significava esta época. União, fé, dedicação.

        Gostava tanto, Menino Jesus, que em todas as casas houvesse ainda um presépio como antigamente. Um presépio que se fizesse com as mãos e com o coração, e que lembrasse a todos o verdadeiro significado desta data. Que fosse mais do que um enfeite, fosse um convite à reflexão, à gratidão, à solidariedade.

        Peço-te, se ainda for possível, que voltes a acender nos lares aquilo que nenhuma loja vende. O calor humano. Um lugar à mesa para todos, uma palavra amiga dita sem pressa. Que cada família receba, pelo menos, um pouco de alegria, daquela que não se embrulha em papel, mas que se espalha como o calor de uma lareira acesa numa noite fria.

        Porque, no fundo, o Natal é isto. É a ternura que se partilha, o respeito que se cultiva, a memória que se honra. E, acima de tudo, a esperança que renasce mesmo quando o mundo parece distraído demais para a notar. A certeza de que, no meio das nossas fragilidades, continuamos a precisar uns dos outros. E de Ti.

 

Por isso te escrevo, Menino Jesus.
Para lembrar o que fomos.
E para pedir que nos ajudes a ser, outra vez, um pouco disso.


 

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